A aguardada segunda temporada de The Last of Us estreou cercada de expectativas, após o estrondoso sucesso de sua primeira parte. Baseada na icônica franquia de videogames criada por Neil Druckmann, a série continua a explorar um mundo devastado por um vírus fúngico que transformou a humanidade em sua própria ruína. Sob a batuta de Craig Mazin e do próprio Druckmann, a nova temporada expande ainda mais os limites da adaptação, aprofundando personagens, ampliando cenários e provocando emoções conflitantes.
Logo de início, nota-se uma mudança significativa de tom. A narrativa agora está mais madura, densa e melancólica. A relação entre Joel (Pedro Pascal) e Ellie (Bella Ramsey) evolui de forma tocante, mas também marcada por silêncios e culpas não resolvidas. O peso dos eventos da temporada anterior paira sobre cada olhar, cada escolha, cada palavra não dita.
A temporada adapta, com algumas liberdades criativas, os acontecimentos do segundo jogo da franquia, que é conhecido por sua estrutura narrativa ousada e divisiva. A série mantém essa essência, fragmentando a linha do tempo e introduzindo novas perspectivas, principalmente com a chegada de Abby (Kaitlyn Dever), uma personagem cuja presença muda completamente a dinâmica da trama.
Um dos pontos mais elogiáveis desta segunda temporada é justamente a coragem de manter a fidelidade emocional ao material original, mesmo sabendo que isso causaria divisão entre os fãs. A construção de Abby é feita com delicadeza e complexidade, evitando o maniqueísmo fácil e apostando na ideia de que, nesse mundo, ninguém é inteiramente herói ou vilão. Kaitlyn Dever entrega uma performance impressionante, transmitindo tanto a brutalidade quanto a vulnerabilidade de sua personagem.
A direção de episódios, mais uma vez, é um espetáculo à parte. Os showrunners investem em planos longos e silenciosos, que potencializam a imersão do espectador nesse mundo apocalíptico. A fotografia mantém os tons frios e desolados, contrastando com momentos de calor humano que surgem esporadicamente, como pequenos lampejos de esperança em meio ao caos.
Pedro Pascal segue irretocável como Joel. Nesta temporada, o personagem se encontra em um estado emocional ainda mais frágil, dividido entre o instinto de proteção e a consciência de que suas escolhas podem ter consequências devastadoras. Pascal transmite essa dualidade com uma sutileza admirável, principalmente em cenas que dispensam palavras e se apoiam apenas em expressões e gestos.
Bella Ramsey, por sua vez, confirma de vez que nasceu para ser Ellie. Sua atuação é visceral, carregada de fúria, tristeza, amor e, acima de tudo, humanidade. A personagem passa por um arco ainda mais doloroso nesta temporada, lidando com perdas, traições e o peso insuportável da vingança. Ramsey transita com maestria entre momentos de vulnerabilidade extrema e explosões de raiva genuína.
Outro destaque vai para a trilha sonora, novamente composta por Gustavo Santaolalla, que continua sendo uma das almas da série. Suas composições melancólicas embalam os episódios com uma sensibilidade que amplifica a dor e a beleza das cenas.
O roteiro, assinado por Mazin e Druckmann, não tem medo de arriscar. A série propõe debates morais complexos, como a natureza do perdão, a espiral da violência e a dificuldade de quebrar ciclos destrutivos. Não há respostas fáceis; o público é constantemente convidado a refletir sobre as motivações e consequências dos atos de cada personagem.
No entanto, essa ousadia narrativa pode não agradar a todos. Alguns fãs podem se sentir desconfortáveis com determinadas escolhas, especialmente em relação ao destino de personagens queridos. A série, assim como o jogo, opta por não poupar o espectador, reforçando sua proposta de realismo emocional e intensidade dramática.
Os efeitos visuais seguem de altíssimo nível, com destaque para a ambientação impecável de novas localidades devastadas, como Seattle, que ganha contornos quase míticos nesta temporada. Os infectados, embora apareçam em menor quantidade, continuam sendo uma ameaça palpável e grotesca, com maquiagem e efeitos práticos de encher os olhos.
As cenas de ação são pontuais, mas intensas. A direção evita o espetáculo vazio e aposta em coreografias cruas e violentas, reforçando a ideia de que a violência nesse mundo não é algo glamouroso, mas sim brutal e, muitas vezes, desnecessária.
O elenco coadjuvante também merece aplausos. Novos personagens são introduzidos de forma orgânica e enriquecem a trama, como Dina (Isabela Merced), que traz um sopro de ternura e leveza ao relacionamento com Ellie. A química entre as duas atrizes é inegável e proporciona alguns dos momentos mais tocantes da temporada.
A narrativa se estrutura em dois blocos claros: o primeiro focado em aprofundar a relação entre Joel e Ellie e estabelecer o impacto de novas ameaças; o segundo mergulha na jornada de Abby e na inevitável colisão entre os dois núcleos. Esse formato pode soar arriscado, mas é executado com precisão cirúrgica, proporcionando uma experiência emocional completa.
O final da temporada é devastador, deixando um gosto agridoce que remete à ideia de que, nesse mundo, as vitórias são sempre parciais e o preço a se pagar é alto demais. A direção opta por um encerramento contemplativo, que respeita a inteligência do público e evita respostas fáceis.
Tecnicamente, a série continua impecável. A direção de arte, figurinos, maquiagem e efeitos especiais se mantêm como referência na indústria. Cada detalhe é pensado para reforçar a imersão do espectador nesse universo hostil e ao mesmo tempo belíssimo.
Um dos elementos mais interessantes desta temporada é a forma como a série explora a temática da memória e do luto. Flashbacks são usados com parcimônia, mas sempre de maneira impactante, revelando camadas emocionais que enriquecem ainda mais a narrativa.
A violência, mais gráfica do que na temporada anterior, nunca é gratuita, mas sim um reflexo do ambiente em que os personagens estão inseridos. A série trata com respeito e seriedade as consequências psicológicas dessas experiências traumáticas.
A cinematografia merece um capítulo à parte. A paleta de cores é cuidadosamente escolhida para refletir os estados emocionais dos personagens e os ambientes em que se encontram. O uso de luz natural confere realismo, enquanto sombras e silhuetas são exploradas para criar atmosferas de tensão ou melancolia.
Apesar de todo o peso dramático, a série sabe dosar momentos de leveza e ternura. Pequenas cenas de humor ou intimidade são estrategicamente inseridas, humanizando ainda mais os personagens e proporcionando respiros necessários ao espectador.
A segunda temporada de “The Last of Us” é, acima de tudo, uma obra corajosa. Não se contenta em repetir a fórmula de sucesso da primeira parte, mas ousa expandir sua mitologia, explorar novos caminhos narrativos e emocionar de formas inesperadas. É um exemplo claro de como adaptações podem honrar o material original, mas também se estabelecer como produções autônomas e artísticas.
Em suma, trata-se de uma temporada que emociona, choca, provoca e, acima de tudo, faz pensar. Um retrato sombrio da condição humana em meio ao colapso, mas também uma ode à resiliência, ao amor e, paradoxalmente, à capacidade de perdoar.

Nota: 4,8/5
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